18 de mai. de 2011

O injustificável

Joãozinho volta da pescaria entra em casa e conta à mãe: “Nós pego o peixe, mãe”!

Fala surreal para uns e habitual para muitos. Provavelmente, a polêmica sobre o livro Por Uma Vida Melhor, da professora Heloisa Ramos, não chegará ao conhecimento dos alunos, na qual esta obra será distribuída, pois, alguns deles não leem nada.

O livro defende a supremacia da linguagem oral sobre a linguagem escrita, admitindo que "é certo falar errado". Corrigir o erro é "preconceito". A tese não é nova, já foi repelida pela Academia Brasileira de Letras e sempre foi duramente criticada nas faculdades de Pedagogia e Letras. Além disso, o livro do MEC que admite erro de português não é uma obra de linguística, mas uma publicação pedagógica. Não foi escrito para linguistas, entretanto, para quem precisa de um bom professor de português para ler, falar e escrever de modo correto: condição básica para que se possa emancipar culturalmente.

A professora Heloisa Ramos, autora do livro, diz: ”Nosso livro é direcionado para aquele que pode ter sido discriminado por falar errado". Isto quer dizer que exigir a correção de linguagem é ser preconceituoso.

Ora, somos um país onde a economia está em desenvolvimento, contudo ainda somos prosaicos quando o assunto é educação, saúde, previdência social, saneamento básico. Ademais, como valorizar o professor, especialmente, o mestre de Língua Portuguesa, se o próprio governo o denigre, esculacha-o e o trata como o ser mais desprezível do Brasil?

Se livros como este são adotados como “adequados”, por que é necessário o professor? Cada um fala o que quer, escreve o que bem entender e está tudo certo, sem erros, sem "preconceitos".

Felizmente, os vestibulares estão aí para provar o contrário. O professor de Português, de Redação está cada vez mais requisitado, haja vista as provas de redação dos melhores vestibulares estão cada vez mais exigentes. Cobram criteriosamente os recursos linguísticos, discursivos, coerência, coesão e adequação ao tema. Dificilmente, quem se expressa mal, lê pouco, tem vocabulário mínimo e não sabe formar uma frase inteira com coerência, saberá escrever corretamente, a saber, a norma padrão culta da língua e, assim, não terá êxito no vestibular e na vida. Ainda mais, os processos seletivos das grandes empresas  que priorizam o “bom” português. Em outras palavras, o português correto, de acordo com a gramática normativa, livre de vícios de linguagem (gírias, clichês, barbarismos), claro, conciso, compreensível, sem ambiguidades.

A língua “oficial” deve ser ensinada como prioridade absoluta, uma vez que os jornais, os livros literários (autoajuda também), os manuais, os livros didáticos de outras matérias, as revistas e tantos outros veículos de comunicação fazem uso do português “culto”, ou seja, novamente a norma padrão. Todas as pessoas, independentemente da classe social, grau de instrução devem falar e escrever sem erros, sabendo que esta é a nossa língua: rica de vocábulos, de construções sintáticas, figura de linguagem.

A escritora Ana Maria Machado, doutora em Linguística e Semiologia, integrante da ABL e ganhadora do Prêmio Hans Christian Andersen - o Nobel da literatura infantil, preconiza com muita propriedade a questão:”  É um absurdo esse paternalismo condescendente de não corrigir erros gramaticais. Com isso, consolida-se o conceito de coitadinho, pernicioso e prejudicial ao desenvolvimento dos cidadãos. Qualquer um pode cometer os barbarismos linguísticos que quiser, mas deve saber que eles só se sustentam dentro de um contexto e têm preço social”.

Preconceito é privar os “mais necessitados”, os “coitadinhos”, denominação utilizada pelo governo para justificar o injustificável, de estudar e aprender a Língua Portuguesa “oficial”; é impedir a compreensão e interpretação de textos diversos; de manter uma conversa, sem dizer apenas: “nossa, hoje vai chover”, “tá calor, hein?”. Desta forma, indubitavelmente, quem fala mal e pensa mal, compreenderá muito pouco do mundo.

Luciana Rossi, leitora contumaz.


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