14 de jul. de 2011

O melhor de Darwin

As teorias de Charles Darwin sobre a evolução e a seleção natural das espécies só foram recebidas no início com entusiasmo por uma pequena parcela da comunidade cientifica. Houve, de fato, muita resistência nos primeiros anos após a publicação, em 1859, de A Origem das Espécies, e suas ideias, apesar de formarem o esteio de boa parte da ciência moderna, são ainda hoje combatidas pelos criacionistas.
Darwin já esperava uma forte oposição de fundo religioso ao propor que o homem tivesse evoluído do macaco e ao colocar por terra os 5.000 anos que a Bíblia calculava para a idade do universo. Também sabia que cientistas mais conservadores resistiriam às suas propostas e o atacariam violentamente.
Entre aqueles que Darwin respeitava e cuja aprovação lhe parecia importante, figurava St. George Mitvart, um biólogo católico inglês que julgou inicialmente as ideias evolucionistas extremamente instigantes. Acenou-lhe com um apoio que o grande cientista apreciou e valorizou tanto mais, que destoava da maior parte das reações de seus pares.
Mais tarde, Mitvart voltou atrás e tornou-se cada vez mais cético. Até publicar, em 1871, Da gênese das espécies, livro no qual criticava ferozmente seu colega, posição que marcou a ruptura entre os dois cientistas.
Em janeiro de 1871, data da carta aqui reproduzida, Darwin nada sabia do teor do livro de Mitvart ,até receber o exemplar mandado por ele, logo após sua publicação. Por coincidência, Darwin publicava no mesmo momento o primeiro volume da Descendência do Homem  – sua segunda obra mais importante -, e mandara um exemplar a Mitvart ao mesmo tempo em este lhe enviava seu livro, no qual rejeitava a seleção natural.


Clique na imagem acima para ampliá-la 
A carta, escrita imediatamente após o grande naturalista ter recebido o libelo de seu adversário, é uma obra-prima de fina ironia e merece ser transcrita na integra:
"21 de janeiro de 1871
Meu caro senhor,
Sou-lhe muito grato por seu amável presente. Levarei algum tempo para lê-lo, pois só posso ler aos poucos qualquer coisa que exija muito raciocínio. Se eu soubesse que seu livro havia sido publicado, não teria naturalmente pedido que lhe enviassem o primeiro volume do meu livro. Também suponho que não lhe dará muita atenção.
É provavel que provoque a sua indignação.Mas sempre posso me consolar ao pensar que fiz o melhor que pude.
Sinceramente seu ,
Charles Darwin”
Que o autor daquela que muitos consideram a maior teoria científica do século XIX se posicione apenas como alguém que fez “o melhor que pode” confere a esta carta, para o leitor moderno, um sabor especial que ainda engrandece – se é que é possível – o gênio de Darwin.

 ** Pedro Corrêa do Lago
* Publicado na Revista Piauí

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