27 de ago. de 2012

Quem é quem no comércio mundial de armas


Estados Unidos já abocanham 78% das exportações mundiais — e são cada vez mais influenciados por seu próprio “complexo industrial-militar”. Por isso, mídia norte-americana prefere falar da China…
Há pelo menos duas décadas, os Estados Unidos são o país com balança comercial mais deficitária do planeta. Ao longo de 2012, suas importações superarão as exportações em cerca de 600 bilhões de dólares — algo como o PIB da Suíça ou da Arábia Saudita. Porém, um setor de sua economia foge a esta regra. Trata-se da indústria armamentista. Além de ser a mais poderosa do mundo, ela ampliou de forma acelerada sua influência nos últimos cinco anos, revelou no domingo o New York Times. Tira proveito, diretamente, das tensões crescentes que a diplomacia de Washington tem provocado — em especial no Oriente Médio e nas disputas com o Irã.
Os números são impressionantes. Num único ano, 2011, as vendas de armamentos por indústrias norte-americanas mais que triplicaram, saltando de de pouco mais de 21,4 bilhões de dólares para cerca de US$ 60 bilhões. Depois deste avanço, os EUA passaram a abocanhar 78% do comércio mundial de armas, deixando muito atrás concorrentes como Rússia (6%), Europa Ocidental (6%) e China (3%).
O grosso das vendas de armamentos dirigiu-se para a região mais conflagrada do planeta. Só a Arábia Saudita — o prinicipal aliado estratégico dos EUA no Oriente Médio — adquiriu US$ 33,4 bilhões em armas pesadas, inclusive 84 caças F-15 e dezenas de helicópteros Apache e Black Hawk. Seguiram-se a ela duas outras monarquias ultra-conservadoras da Península Arábica, ambas fortemente alinhadas com Washington: Emirados Árabe o Omã. Segundo o New York Times, a causa essencial do aumento extraordinário de vendas foram “as preocupações com as ambições regionais de Teerã”.
O Irã, contudo, não compartilha fronteiras com nenhum dos super-compradores de armas norte-americanas, lembra o próprio jornal. A venda de artefatos bélicos foi, portanto, fortemente influenciada pela própria diplomacia dos Estados Unidos, que se encarregou de demonizar o regime iraniano. Mas até quando a indústria armamentista poderá vender tanto, em tempos de paz? Em algum momento, ela não tentará criar condições para que os equipamentos que distribui sejam de fato utilizados em combate?
As relações promíscuas entre indústria de armas, comandos militares e poder político nos Estados Unidos foram apontadas pela primeira vez pelo presidente Dwight Eisenhower — que cunhou a expressão “complexo industrial-militar”. No discurso de despedida que pronunciou em 1961, ele alertou: “nossa organização militar atual parece muito pouco com tudo o que pôde ser conhecido por qualquer um de meus antecessores em épocas de paz, ou mesmo pelos que lutaram na II Guerra ou no conflito da Coreia. (…) A conjunção de um imenso establishment militar e uma grande indústria de armas é nova na experiência norte-americana. Sua influência — econômica, política e mesmo espiritual — é sentida em cada cidade, em cada câmara estadual, em cada escritório do governo federal. (…) Não devemos deixar de compreender suas graves implicações. (…) Precisamos nos proteger contra a conquista de influência, intencional ou não, pelo complexo industrial-militar”.
No sábado, um sinal da “influência espiritural” da indústria de armamentos pôde ser sentida no sábado. Sem fazer referência alguma aos EUA, o Washington Post destacou, numa longa matéria com chamada de capa, “o grande crescimento das exportações chinesas de armas, na última década”…
Fonte:
Por
Antônio Martins
Outras Palavras

24 de ago. de 2012

As fotos mais marcantes da História


10. Almoçando no arranha-céu (1932)

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Essa imagem famosa, clicada pelo fotógrafo Charles C. Ebbets, mostra alguns operários tranquilamente comendo seus almoços, sentados em uma viga no 64º andar de um prédio em construção, em Nova York.

O que pouca gente sabe é que existe uma foto tirada pelo mesmo fotógrafo que dá ainda mais aflição: os trabalhadores tirando uma soneca na viga! Eu, heim!
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9. Criança faminta no Sudão (1994)

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Essa não é apenas uma das fotos mais famosas de todos os tempos, vencedora do Pulitzer Prize, como também uma das mais polêmicas que já existiram. Registrada no Sudão pelo fotógrafo sul-africano Kevin Carter, mostra uma garotinha sofrendo de extrema fome, enquanto um urubu aguarda sua morte.
A polêmica gira em torno do fato do fotógrafo supostamente ter esperado 20 minutos pra registrar a imagem, na esperança que a ave abrisse as asas, gerando um visual mais impactante, para só depois ajudar a criança. Alguns jornais na época disseram que o verdadeiro urubu era o fotógrafo, que arrumava lentes ao invés de ajudar uma criança faminta.
O fotógrafo português João Silva, que estava junto com Carter na hora do registro, conta outra versão dos fatos, afirmando os pais da criança já estavam recebendo mantimentos de uma missão da ONU, a alguns metros do local da foto, e que Carter tirou apenas algumas fotos e em seguida espantou o urubu.
Carter suicidou-se alguns meses depois de ganhar o prêmio por essa fotografia.

8. Abbey Road (1969)

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No dia 8 de agosto de 1969, um pouco antes do meio-dia, o fotógrafo Iain McMillan usou uma escada para erguer-se a três metros do chão e tirar uma das mais famosas fotos dos Beatles – exatamente da forma que Paul McCartney tinha desenhado, alguns dias antes.
Curiosidade? John Lennon conheceu o fotógrafo por intermédio de Yoko Ono.

7. Bandeira no Reichstag (1945)

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Esse famoso registro do momento em que os soviéticos tomaram o mais importante prédio da Alemanha, o Reichstag, durante a famosa batalha de Berlim, foi tirada pelo fotógrafo Yevgeny Khaldei. A identidade dos homens na fotografia é controversa, já que imagina-se que a foto não seja exatamente do momento de tomada do prédio, mas uma encenação depois que o edifício já estava pacificado e em poder dos soviéticos.
Essa também é uma das mais famosas imagens antigas a passar por uma espécie de Photoshop. O fotógrafo fez pequenas alterações manualmente na imagem: a primeira foi a adição artificial de neblina no fundo, para tornar o clima mais dramático.
A outra modificação foi um pedido (err, exigência) do governo soviético – perceba que o rapaz que ajuda a erguer a bandeira parece ter dois relógios. Na realidade, ele tinha um relógio em um pulso, e umcompasso, utensílio típico do Exército Vermelho, em outro. O governo, contudo, temeu que pudesse parecer que ele estivesse carregando dois relógios – e, portanto, as pessoas concluíssem que ele roubou ou saqueou um deles – e Khaldei teve que apagar o da mão direita.

6. Albert Einstein (1951)

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No aniversário de 72 anos do cientista Albert Einsten, o fotógrafo Arthur Sasse tentava convencer o autor da teoria da relatividade a dar um sorriso para a câmera. Eis que Einsten provou sua verdadeira genialidade, mostrando a língua para Sasse!
A imagem tornou-se o mais famoso retrato de Albert Einstein, elevando o cientista a símbolo pop.

5. Phan Thi Kim Phuc (1972)

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Esse chocante registro da Guerra do Vietnã foi tirado por Nick Ut no dia 8 de junho de 1972, em Trang Bang.
A imagem mostra a garotinha Kim Phuc com apenas nove anos, correndo nua pela rua depois de ser severamente queimada nas costas por um ataque nepalm. O vilarejo que ela vivia, que estava sob o poder de tropas norte-vietnamitas, foi atacada por aviões sul-vietnamitas.
Depois de tirar a foto, Ut levou Kim e as outras crianças feridas a um hospital, em Saigon. Lá, as feridas de Kim foram avaliadas como muito graves, e afirmou-se que a garota não poderia sobreviver. Ainda assim, contrariando todas as expectativas, ela recebeu alta depois de 14 meses e 17 cirurgias. O fotógrafo continuou a visitar a menina pelos próximos três anos, até que ela foi evacuada de Saigon.
Nick Ut recebeu, por essa foto, o Prêmio Pulitzer e o World Press Photo of the Year.
E, se você quer saber o que aconteceu a Kim… Ela cresceu, estudou medicina, casou, e hoje vive no Canadá – além de ter criado a Fundação Kim Phuc, que auxilia no tratamento médico e psicológico de crianças envolvidas em situações de guerra.

4. V-J Day in Times Square (1945)

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Essa imagem, registrada pelo fotógrafo Alfred Eisenstaedt registra a euforia americana com o fim da II Guerra Mundial. Segundo o fotógrafo, esse jovem marinheiro estava beijando todas as mulheres que encontrava pela praça, fosse ela “uma avó, magricela, gordinha…”.
Eisenstaedt ainda contou que resolveu tirar a foto porque ficou encantado com o constraste entre as vestimentas escuras do marinheiro e o vestido branco da enfermeira.
Ainda bem que rendeu uma boa foto, porque o marinheiro foi castigado por sua ousadia: assim que parou de beijar a enfermeira, ela deu-lhe um bofetão no meio da cara!

3. Praça Tiananmen (1989)

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Na verdade, essa não é apenas uma foto. Existem duas fotografias, muito similares, que registram esse momento: cansado das violentas repressões dos governo chinês contra cidadãos que queriam mais liberdade, um rapaz coloca-se à frente dos tanques de guerra.
As fotografias foram tiradas pelos fotógrafos Stuart Franklin e Jeff Widener.
Se você está curioso para saber, não, o rapaz não foi amassado pelos tanques. Um grupo de pessoas arrastou ele para segurança, antes que isso acontecesse. Não se sabe, contudo, se ele sobreviveu, já que o governo chinês executou muito dos envolvidos no protesto.
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2. Guerillero Heroico (1960)

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Foi essa imagem, registrada por Alberto Korda em 5 de março de 1960, em Havana, que catapultou Che Guevara de guerrilheiro carismático a ícone pop. Trata-se de uma das imagens humanas mais reproduzidas do mundo.
Che tinha 31 anos na época que a foto foi tirada. Korda explicou que, apesar de Che estar na plateia assistindo a uma homenagem, ele não resistiu a tirar a foto, graças a forte expressão do guerilheiro. Ainda bem, né?

1. Garota Afegã (1984)

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O primeiro lugar do nosso ranking vai para a intensa fotografia que Steve McCurry fez para a revista National Geographic. A imagem, que registra a jovem refugiada afegã Sharbat Gula, na época com 12 anos, ficou conhecida mundialmente como A Garota Afegã - ou, numa clara alusão à fama mundial que o retrato conquistou, A Monalisa Afegã.
Gula era aluna de uma escola clandestina, em um campo de refugiados no Paquistão, na época da ocupação soviética do Afeganistão. O conflito em sua terra natal havia a deixado órfã, e, junto de sua avó e seus irmãos Gula teve que fugir a pé, pelas montanhas, para o país vizinho.
A forma lança seu olhar quase hipnótico diretamente em direção à câmera cativou o público do mundo todo. Curiosamente, a verdadeira identidade de um dos rostos mais reconhecidos do mundo só foi conhecida 17 anos depois, quando, após inúmeros esforços, McCurry encontrou a retratada.
Sharbat foi reconhecida com 100% de precisão graças a uma moderna técnica de identificação pelo padrão da íris, que, assim como a impressão digital, é único em cada ser humano. A afegã, então com 30 anos, viu pela primeira vez seu famoso retrato, e foi fotografada para a capa da National Geographic novamente.
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Fonte:
www.falacultura.com

20 de ago. de 2012

Atenção: mudanças na Redação da Unicamp


Mudanças

Diferente do vestibular anterior, no qual os candidatos deveriam redigir três textos na prova de redação, no Vestibular Unicamp 2013, os candidatos serão solicitados a produzir apenas dois textos de gêneros diversos e de execução obrigatória na prova de redação.

Foram criados quatro novos cursos de graduação: Engenharia de Telecomunicações (50 vagas, período integral), Sistemas de Informação (45 vagas, integral), Engenharia Ambiental (60 vagas, período noturno) - oferecidos na Faculdade de Tecnologia (FT) de Limeira e Engenharia Física (15 vagas, período integral), no campus de Campinas, em Barão Geraldo. Deixam de existir os cursos: Tecnologia em Sistemas de Telecomunicações e Tecnologia em Análise e Desenvolvimento de Sistemas (integral). Já a opção: Engenharia Física passa a integrar a lista de cursos com ingresso através do cursão (Física/Matemática/Matemática Aplicada e Computacional). A criação e a extinção dos cursos citados, não altera o número de vagas oferecidos no Vestibular Nacional Unicamp 2013.
O número de convocados para a segunda fase, em cada curso, passa de oito para, no máximo, seis vezes o número de vagas oferecidas, considerando os candidatos que optaram pelo curso em primeira opção.
As provas deixam de ser aplicadas nas cidades de Curitiba e Rio de Janeiro.

Enem

Sobre o uso do Enem no vestibular deste ano, a Comvest informa que:
- só serão utilizadas as notas do Enem para fins de classificação para a segunda fase do vestibular caso o Ministério da Educação (MEC) disponibilize o cadastro e as notas relativas ao Enem 2012 até o dia 30 de novembro de 2012. Caso contrário, as notas do Enem, de 2011 ou de 2012, não serão consideradas para nenhum candidato nessa fase do vestibular;
- só serão utilizadas as notas do Enem para compor a nota da primeira fase no cálculo da nota final do vestibular caso o Ministério da Educação (MEC) disponibilize o cadastro e as notas relativas ao Enem 2012 até o dia 15 de janeiro de 2013. Caso contrário, as notas do Enem, de 2011 ou de 2012, não serão consideradas para nenhum candidato do vestibular.
Isenção e Redução da taxa de inscrição
Os candidatos beneficiados com a isenção do pagamento da taxa de inscrição não são automaticamente inscritos no vestibular. É preciso realizar a inscrição, no mesmo período dos demais candidatos, utilizando o código específico de candidato isento, disponível na página da Comvest. Os pedidos de isenção da taxa de inscrição do Vestibular Unicamp 2013 foram recebidos no mês de maio. Para o Vestibular Unicamp 2013, a Comvest beneficiou4.613 candidatos com a isenção do pagamento da taxa de inscrição.
No período de 21 de agosto (9 horas) a 24 de agosto (17 horas), a Comvest aceitará declarações de interesse de redução parcial da taxa de inscrição (50%). Podem solicitar a redução candidatos que cumulativamentepreencham os seguintes requisitos: sejam estudantes regularmente matriculados em uma das séries do ensino fundamental ou médio ou curso pré-vestibular ou curso superior (graduação e pós-graduação); e estejam desempregados ou recebam menos de dois salários mínimos por mês. Os estudantes que fizerem a declaração de interesse pela redução parcial deverão comparecer com a documentação que comprove sua situação (originais e cópias) no Ginásio Multidisciplinar da Unicamp, no dia 28 de agosto de 2012, das 9 às 20 horas. A lista de documentos necessários para comprovar a condição do estudante está disponível nesta página. A Comvest divulgará a lista de beneficiados com a redução de 50% da taxa de inscrição dia 31 de agosto, em sua página eletrônica.

Nem sei se posso, mas quero

O deslumbramento pelo consumo não pode durar para sempre. Em algum momento a sociedade brasileira precisará amadurecer, afirma filósofo


Sorry, brazucas... Em um breve e irônico post publicado nessa semana na revista americana Forbes, o jornalista Kenneth Rapoza endereçou críticas aos consumidores brasileiros: "Não há status em um Toyota Corolla, Honda Civic, Jeep Grand ou Dodge Durango. Definitivamente, vocês estão sendo roubados".


Estamos? Estamos. E não só nas cifras milionárias desembolsadas para adquirir carrões e outros luxuosos mimos (sem os quais viveríamos muito bem, obrigado). "Estamos vivendo uma corrida armamentista do consumo", critica o economista e filósofo Eduardo Giannetti, autor de O Valor do Amanhã: Ensaio sobre a Natureza dos Juros e do best-seller Felicidade: Diálogos sobre o Bem-estar na Civilização (ambos Companhia das Letras).

Para Giannetti, nós brasileiros estamos dispostos a pagar preços estratosféricos por carros importados (luxuosos e nem tanto), pois eles nos conferem a ilusória ideia de status. São "bens posicionais", que hierarquizam a sociedade na antiga fórmula quanto mais caro, mais exclusivo; quanto mais exclusivo, mais status. "Primeiro é um tênis de marca, depois um carro importado, um iate, um jatinho, uma viagem a Marte. A corrida sempre se renova", diz. É o carro do ano, o look exclusivo da fashion week, o restaurante badalado, a deserta ilha paradisíaca e outras extravagâncias de gente chique. Para serem almejados, os objetos devem continuar um privilégio de poucos, fora do alcance dos plebeus. Nessa lógica, o diamante só brilha se refletir nos olhos dos outros.
Na quinta-feira, Giannetti recebeu o Aliás no seu apartamento no bairro paulistano de Vila Madalena. Ph.D. pela Universidade de Cambridge, na Inglaterra, e professor do Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper) de São Paulo, Giannetti costura economia e filosofia para discutir por que os ideais de beleza, poder e riqueza abalam a psique humana de uma maneira quase irracional. "Por que nos deixamos levar pelas promessas desses bens posicionais? Por que somos iludidos por eles?", questiona. Para responder à questão, Giannetti busca na estante O Livro das Citações: Um Breviário de Ideias Replicantes, de sua autoria, com páginas marcadas por post its coloridos, e cita o poeta satírico Petrônio: "Só me interessam os bens que despertam no populacho a inveja de mim por possuí-los".
Conversamos numa sala ampla, charmosa e emoldurada por estantes e mais estantes cheias de livros. Só na biblioteca pessoal, o economista guarda mais de 5 mil títulos. "São meus bens posicionais", diz, brincando a sério. "Todos nós temos bens posicionais. Seria uma ilusão dizer que não. Pascal tinha um pensamento interessante: 'Os seres humanos se dividem em duas classes: os santos que se creem pecadores, e os pecadores que se creem santos.' Prefiro estar entre os santos."
Na Forbes dessa semana, Kenneth Rapoza ironiza os preços exorbitantes que os brasileiros pagam por carros importados. Afinal, por que aceitamos pagar tão caro?


Por um lado, porque não há alternativa. A indústria automobilística brasileira é altamente protegida. Os importados pagam uma tarifa exorbitante para entrar no País. Os carros ficam com um preço muito acima do mercado internacional, mesmo descontando os impostos. Por outro lado, os brasileiros se submetem aos preços pois os carros são "bens posicionais". A ideia é do economista inglês Fred Hirsch. O valor do bem posicional depende justamente da "exclusividade", isto é, do fato de que os outros não têm acesso a esses bens. Quanto mais caro, mais exclusivo. Quanto mais exclusivo, mais status. E, portanto, mais poder para impressionar os outros. O filósofo francês Nicolas Malebranche dizia que o desejo mais ardente das pessoas é conquistar um lugar de honra na mente dos seus semelhantes. Essa é a ideia do bem posicional: o proprietário pensa que as pessoas passam a respeitá-lo e admirá-lo mais porque ele pode desfilar um carrão, uma grife, um luxo.

Mas todos os bens são consumidos assim?


Há uma diferença. Um copo de leite, por exemplo, é um bem normal. Se tenho prazer em beber um copo de leite todas as manhãs, isso independe do resto da sociedade. Se amanhã todo mundo beber um copo de leite igualzinho, o meu prazer não mudará uma gota. Mas suponha que eu sou um jovem ambicioso, trabalho 12 horas no mercado financeiro, ganho meu dinheiro honestamente e decido que a coroação da minha vitória será um automóvel caríssimo. Compro meu carro dos sonhos - um BMW, um Mercedes ou um dos carros mencionados pela Forbes - e, de repente, tenho um estalo: "Eu sou especial". As meninas vão ver um brilho diferente no meu olhar, os amigos vão me invejar, os outros vão me respeitar quando passar na rua. Volto para casa feliz da vida. Mas, na manhã seguinte, acontece uma coisa estranha: todos os carros da cidade se transformaram em BMWs idênticos ao meu. E aí? Será que esse carro ainda tem a importância e o valor que tinha aos meus olhos e aos olhos dos demais? Ou será que o poder que ele me conferia simplesmente desapareceu? Pois é, desapareceu. Uma das melhores definições dessa ideia é do satírico romano Petrônio: "Só me interessam os bens que despertam no populacho a inveja de mim por possuí-los". Isso foi dito na Roma antiga, há dois milênios. Uma passagem de Adam Smith, n'A Riqueza das Nações (1776), também ilustra isso: "Para a maior parte das pessoas ricas, a principal fruição da riqueza consiste em poder exibi-la, algo que aos seus olhos nunca se dá de modo tão completo como quando elas parecem possuir aqueles sinais definitivos de opulência que ninguém mais pode ter a não ser elas mesmas". Essa é uma definição irretocável do bem posicional. Quer dizer, sim, compramos um sinal de opulência e de distinção, um prestígio, um brilho - embora muitas vezes sabendo que estamos sendo roubados. Mas, afinal, por quê? Beleza, poder e riqueza mexem com o psiquismo humano de uma maneira quase pré-racional. Não percebemos quão vulneráveis somos a esses apelos. Isso certamente não é de hoje. Ao longo da história, muitos pensadores se debruçaram sobre essa questão, a partir de uma perspectiva ética. Como entender o fascínio por beleza, poder e riqueza? Por que nos deixamos levar por essas promessas? Por que somos iludidos por esses bens posicionais?

No mês passado, os brasileiros marcaram níveis históricos de inadimplência (na série do Banco Central iniciada em 2000). Vale tudo para poder adquirir esse bens?


Estamos vivendo uma corrida armamentista do consumo, pois o bem posicional sempre se renova. Isto é, no momento em que se democratiza o acesso a um bem de consumo, outros novos são inventados. É como uma corrida armamentista: sempre teremos novos e diferenciados objetos de desejo. Primeiro é um tênis de marca, depois um carro importado, um iate, um jatinho, uma viagem a Marte. A corrida armamentista sempre se renova. Não dá para desmontar totalmente as armadilhas dessa corrida, mas podemos almejar uma sociedade mais madura e marcada por uma pluralidade de valores. Assim nem todos estariam competindo na raia estreita, por um carro x ou y. Deveríamos conquistar um lugar de honra na sociedade mais pelo que somos e menos pelo que possuímos.

Há diferenças entre a sociedade de consumo de outros países e a do Brasil atual?


O que complica o Brasil é a desigualdade. Isso acirra e exacerba o poder do dinheiro, da posse, da propriedade. Quem não tem superestima o que o dinheiro pode comprar, ficando muito vulnerável a fantasias e fascínios sobre o status. Na outra ponta, o rico tem o poder superdimensionado por poder comprar o trabalho dos outros a um preço aviltado, adquirindo uma preeminência desmesurada na sociedade. Mas a novidade brasileira é a mobilidade social dos últimos dez anos. Cerca de 30 milhões de brasileiros, antes praticamente excluídos, passaram a ter acesso ao mercado de consumo. Há um momento de deslumbramento diante dessas novas possibilidades, o que é natural, pois essas pessoas tiveram uma demanda reprimida durante diversas gerações. Por isso elas vão com muita sede ao pote, que lhes foi negado por muito tempo. Mas esse deslumbramento não pode durar para sempre. Em certo momento, a sociedade precisará amadurecer. E as pessoas, principalmente dessa nova classe média, vão precisar pensar no futuro.

O que quer essa nova classe média?


É o que todos queremos saber. Mas podemos dizer que essa nova classe média tem uma demanda vigorosa por credenciais educacionais. O que até seria certo, mas a ideia de educação é que está equivocada. Educação é conhecimento, cultura, formação, habilidades, informação. E não simplesmente um diploma, um papel vazio. Um dos dados mais estarrecedores dos últimos tempos foi revelado na pesquisa feita pelo Ibope. Um dado realmente alarmante: 38% dos egressos do ensino superior no Brasil são analfabetos funcionais. Há alguma coisa muito grave e muita errada em um sistema educacional em que isso acontece. Se tiver o mínimo de seriedade e até de autorrespeito, o governo deveria se debruçar sobre essa realidade, principalmente neste momento de ascensão social.

No livro O Valor do Amanhã o sr. diz que o imediatismo impera na sociedade brasileira. Como isso se traduz no consumo?


A imaginação brasileira é muito volátil: quando as coisas vão mal, as pessoas caem em desesperança radical; quando as coisas vão bem, elas caem na euforia e na exuberância. A lâmina da sobriedade precisa cortar nas duas direções. Essa preferência pelo presente, mesmo a um custo elevado no futuro, é uma das características mais marcantes da vida brasileira, com raízes históricas desde a colonização. Atualmente, dá para notar isso em muitas dimensões: a formação de capital humano, a infraestrutura, a poupança previdenciária. Os nossos juros exorbitantemente elevados são sintomáticos dessa predileção pelo presente. Eu me inspiro num conto de Machado de Assis intitulado, não por coincidência, O Empréstimo. Machado descreve um personagem com vocação para a riqueza, mas sem vocação para o trabalho. E a resultante é: dívida. Adaptei isso para a sociedade brasileira, pois o Brasil me parece um país com vocação para o crescimento, mas sem vocação para a poupança. E a resultante disso é desequilíbrio macroeconômico.

Com a ascensão dessa classe emergente, os ricos vão querer esbanjar ainda mais para manter seu status e seus bens posicionais?


Nós temos um quadro curioso de discriminação social no Brasil: as pessoas da elite financeira e econômica se sentem diferentes do resto da sociedade e não querem ter seus privilégios ameaçados. Por outro lado, o País tem uma inconsistência estrutural interessante em diversos campos: nos transportes, na moradia, na educação. A nova classe média tem uma demanda, legítima e até natural, por automóveis, um símbolo de autonomia e status. Mas temos infraestrutura para acompanhar uma agressiva expansão da frota? O avião, por exemplo. Antes restrito, o transporte aéreo agora está recebendo muita gente (e é bom que isso aconteça), mas temos infraestrutura para ordenar esse crescimento? Não, aí o caos nos aeroportos. A mesma falha na questão habitacional: há uma imensa demanda por moradia, absolutamente legítima e muito bem-vinda, por casa própria. Minha Casa, Minha Vida é a cereja do PAC. Mas temos infra urbana de saneamento básico, por exemplo, para dar real dignidade às pessoas? Em pleno século 21, 40% dos domicílios brasileiros não têm saneamento básico, o que é gravíssimo. E a telefonia? Todo mundo tem celular atualmente, mas ninguém consegue se comunicar direito por causa das panes do sistema. Nesses exemplos e em outras situações, encontramos a mesma inconsistência. Nós fazemos a parte fácil - relacionada ao consumo imediato -, mas temos muita dificuldade para dar estrutura a essas demandas de uma maneira sustentável e ordenada. Então, a vida cotidiana é conturbada. É um pesadelo vivido pela sociedade inteira, independentemente da classe social.

Por
Eduardo Giannetti
ECONOMISTA E FILÓSOFO, Ph.D. PELA UNIVERSIDADE DE CAMBRIDGE, PROFESSOR DO INSPER. É AUTOR DE O VALOR DO AMANHÃ
Aliás, O Estado de S. Paulo

18 de ago. de 2012

Não há trabalho decente sem igualdade de gênero


Na última semana, a OIT (Organização Internacional do Trabalho), realizou, em Brasília, a 1ª. Conferência Nacional de Emprego e Trabalho Decente (CNETD). No processo que culminou com a Conferência, participaram 25 mil pessoas. As propostas e discussões realizadas podem, em um futuro próximo, desencadear e avançar na realização e execução de um Plano Nacional de Emprego e Trabalho Decente.
De acordo com a OIT, o conceito de Trabalho Decente, deve ser encarado como uma síntese da sua missão histórica de promover oportunidades para que homens e mulheres obtenham um trabalho produtivo e de qualidade, em condições de liberdade, equidade, segurança e dignidade humanas. O Trabalho Decente é o ponto de convergência dos quatro objetivos estratégicos da OIT (o respeito aos direitos no trabalho, a promoção do emprego, a extensão da proteção social e o fortalecimento do diálogo social), e condição fundamental para a superação da pobreza, a redução das desigualdades sociais, a garantia da governabilidade democrática e o desenvolvimento sustentável.
Neste sentido, a conciliação entre o trabalho e a vida pessoal e familiar está intrinsecamente relacionada ao conceito de Trabalho Decente, principalmente no que tange à liberdade, inexistência de discriminação e capacidade de assegurar uma vida digna a todas as pessoas que vivem de seu trabalho. É uma dimensão central de uma estratégia de promoção da igualdade de gênero no mundo do trabalho e exige a articulação de ações nos mais diversos âmbitos – político, social, governamental, empresarial e individual – que possam conduzir a uma nova organização do trabalho e da vida familiar.
Para tanto, é necessário avançar no rompimento dos mecanismos tradicionais de divisão entre o trabalho produtivo e reprodutivo que perpetuam desigualdades e discriminações de gênero, fazendo com que o maior peso das responsabilidades familiares recaia fundamentalmente sobre as mulheres, com consequências negativas em relação às suas oportunidades de acesso a um Trabalho Decente, assim como sobre a vida familiar.
O equilíbrio entre o trabalho e as responsabilidades familiares constitui um grande desafio. Trabalho e família são esferas da vida social regidas por lógicas diferentes – uma pública e outra privada – mas que se afetam mutuamente. As pessoas precisam trabalhar e gerar renda para satisfazer suas necessidades econômicas (pessoais e de suas famílias) e, ao mesmo tempo, cuidar da família e desempenhar tarefas domésticas não remuneradas em seus lares.
O uso do tempo, um bem escasso, torna tensa a relação entre essas esferas. A insegurança e a instabilidade no trabalho aumentaram nos dias atuais e as jornadas de trabalho se tornaram menos previsíveis e mais intensas. Essa tensão afeta particularmente as mulheres, já que a responsabilidade sobre as tarefas domésticas e as atividades de cuidado geralmente recai sobre elas.
Conforme relatório sobre a análise do Trabalho Decente no Brasil desenvolvido pela OIT, é importante lembrar que, Independentemente do nível de desenvolvimento dos países, em praticamente todos eles o trabalho dedicado à reprodução social é predominantemente de responsabilidade das mulheres. No Brasil, em 2009, considerando a população residente com 16 anos ou mais de idade, as mulheres dedicavam em média duas vezes e meia mais tempo que os homens aos afazeres domésticos: 26,6 contra 10,5 horas semanais.
Conforme chama a atenção o IPEA (2010), a participação dos homens nos afazeres domésticos está mais concentrada em atividades interativas, como a realização de compras de mantimentos em supermercados, o transporte dos filhos para a escola e, ainda, atividades esporádicas de manutenção doméstica, como reparos e consertos no domicílio. Uma informação do suplemento da PNAD de 2008 é bastante ilustrativa dessa situação. Cerca da metade (49,7%) das pessoas de 14 anos ou mais de idade, costumavam fazer faxina no próprio domicílio, sozinha ou com a ajuda de outra pessoa. Enquanto que esta prática era comum para 72,1% das mulheres, entre os homens era de apenas 25,4%.
Quando são analisadas as especificidades referentes à dupla jornada, isto é, à conciliação entre os trabalhos de reprodução social e de produção propriamente econômica, as desigualdades de gênero se manifestam de forma ainda mais evidente. Os dados da PNAD de 2009 chamam a atenção para a real dimensão desta problemática. Entre o conjunto das mulheres brasileiras ocupadas, uma expressiva proporção de 90,7% também realizava afazeres domésticos, enquanto que entre os homens tal proporção era significativamente inferior (49,7%), refletindo que somente a metade dos trabalhadores do sexo masculino se dedicava aos afazeres domésticos.
A massiva incorporação das mulheres ao mercado de trabalho, infelizmente, não vem sendo acompanhada de um satisfatório processo de redefinição das relações de gênero com relação à divisão sexual do trabalho, tanto no âmbito da vida privada, quanto no processo de formulação de políticas públicas e de ações por parte de empresas e sindicatos, especialmente no concernente as responsabilidades domésticas e familiares. Em outras palavras, a incorporação das mulheres ao mercado de trabalho vem ocorrendo de forma expressiva sem que tenha ocorrido uma nova pactuação em relação à responsabilidade pelo trabalho de reprodução social, que continua sendo assumida, exclusiva ou principalmente, pelas mulheres.
Fonte:


Blog 'Além da Economia'

Por que o Equador ofereceu asilo a Assange


O Equador tomou a decisão correta: oferecer asilo político a Julian Assange. Ela segue-se a um incidente que pode dissipar as dúvidas sobre que motivos levam os governos britânico e sueco a tentar extraditar o fundador do Wikileaks. Na quarta-feira, o governo do Reino Unido lançou uma ameaça sem precedentes, de invadir a embaixada do Equador, se Assange não fosse entregue. Este assalto seria um ato extremo, na violação do direito internacional e das convenções diplomáticas. É até difícil encontrar exemplo de um governo democrático que tenha sequer feito tal ameaça, quanto mais executá-la.
Quando o ministro das Relações Exteriores do Equador, Ricardo Patiño, tornou públicas, numa resposta irritada e desafiadora, as ameaças que recebera por escrito, o governo britânico tentou voltar atrás e dizer que não se tratava de uma ameaça de invasão da embaixada (que é território soberano de outro país). Mas o que mais poderiam significar estas palavras, extraídas da carta entregue por uma autoridade britânica?
“É preciso adverti-los que há base legal, no Reino Unido – a Lei de Edifícios Diplomáticos e Consulares, de 1987 – autorizando-nos a agir para prender o Sr. Assange, nas instalações da embaixada. Esperamos sinceramente não chegar a tal ponto, mas se vocês não foram capazes de resolver o assunto da presença do Sr. Assange em suas instalações, há uma opção aberta para nós”.
Alguém em seu juízo acredita que o governo britânico faria esta ameaça inédita, caso se tratasse apenas de um cidadão estrangeiro qualquer, perseguido por um governo estrangeiro por polemizar – não há acusações criminais, nem um julgamento?
A decisão do Equador, de oferecer asilo político a Assange era previsível e razoável. Mas é também um caso paradigmático, de considerável significado histórico.
Primeiro, os méritos do caso: Assange tem medo bem fundamentado de sofrer perseguição, caso seja extraditado para a Suécia. Sabe-se perfeitamente que ele seria encarcerado de imediato. Como não é acusado de crime algum, e o governo sueco não tem razões legítimas para levá-lo a seu país, esta é uma primeira forma de perseguição..
Podemos inferir que os suecos não têm razões legítimas para a extradição porque a oportunidade de interroga-lo no Reino Unido foi-lhes oferecida repetidamente. Mas a rejeitaram, recusando-se inclusive a apresentar razões para tanto. Há algumas semanas, o governo equatoriano ofereceu-se a autorizar o interrogatório de Assange em sua embaixada londrina, onde o fundador do Wikileaks reside desde 19 de junho. Mas o governo sueco recusou-se – novamente, sem oferecer razão. Foi um ato de má-fé, no processo de negociação que se estabeleceu entre os governos, para tentar resolver a situação.
O ex-procurador-chefe do distrito de Estocolmo, Sven-Erik Alhem também deixou claro que o governo sueco não tem razões legítimas para requerer a extradição de Assange, quando afirmou que o pedido do governo sueco é “irrazoável e não-profissional, assim como injusto e desproporcional”, já que ele poderia ser facilmente interrogado no Reino Unido.
Ainda mais importante, o governo do Equador concorda que Assange tem medo razoável de uma segunda extradição para os Estados Unidos, e de ser perseguido aqui por suas atividades como jornalista. A evidência é forte. Alguns exemplos: uma investigação em andamento, sobre Assange e o Wikileaks, nos EUA; evidências de que um indiciamento já foi preparado; declarações de autoridades importantes, como a senadora Diane Feinstein, do Partido Democrata, de que ele deveria ser processado por espionagem, o que potencialmente pode levar à pena de morte ou prisão perpétua.
Por que este caso é significativo? Provavelmente, é a primeira vez que um cidadão que foge de perseguição política pelos Estados Unidos recebe asilo de um governo democrático interessado em fazer valer as convenções internacionais de direitos humanos. É algo de relevância enorme, porque por mais de 60 anos – especialmente durante a Guerra Fria — os EUA tentaram retratar a si mesmos como defensores internacionais dos direitos humanos. E muitas pessoas buscaram e receberam asilo nos EUA.
A ideia de que o governo dos EUA é um paladino dos direitos humanos, que foi aceita principalmente no próprio país e em seus aliados, desprezou os direitos humanos das vítimas das guerras e da política externa norte-americanas. É o caso de 3 milhões de vietnamitas ou de mais de um milhão de iraquianos mortos, e milhões de outros desabrigados, feridos ou maltratados por ações dos EUA. Esta concepção – segundo a qual os EUA deveriam ser julgados apenas segundo o que fazem em suas fronteiras – está perdendo apoio à medida em que o mundo torna-se mais multipolar, econômica e politicamente. Washington perde poder e influência e suas guerras, invasões e ocupações são vistas por cada vez menos gente como legítimas
Ao mesmo tempo, na última década, deteriorou a situação dos direitos humanos nos próprios Estados Unidos. É claro que, antes da legislação dos direitos civis, nos anos 1960, milhões de afro-americanos nos Estados do sul não podiam votar nem tinha outros direitos civis – e o constrangimento internacional provocado por isso contribuiu para o sucesso do movimento pelos direitos civis. Mas ao menos, ao final daquela década os EUA podiam ser vistos como um exemplo positivo, em termos de domínio da lei, garantia do devido processo e proteção dos direitos e liberdades civis.
Hoje, os EUA reivindicam o direito de deter indefinidamente seus cidadãos. O presidente pode ordenar o assassinato de um cidadão sem que ele sequer seja ouvido. O governo pode espionar seus cidadãos sem autorização judicial. E as autoridades são imunes a processo por crimes de guerra. Contribui para a deterioração da imagem o fato de os Estados Unidos contarem com menos de 5% da população mundial, mas quase um quarto da população encarcerada – em boa parte, vítima de uma “guerra às drogas” que também está perdendo legitimidade rapidamente, no resto do mundo.
A busca bem-sucedida de asilo por Assange é outra nódoa na reputação internacional de Washington. Mostra, ao mesmo tempo, como é importante ter governos democráticos independentes dos Estados Unidos e não dispostos – ao contrário da Suécia e do Reino Unido – a colaborar, em nome da conveniência, na perseguição de um jornalista. Seria desejável que outros governos fizessem a Inglaterra saber que as ameaças de invadir embaixadas estrangeiras colocam-na fora das fronteiras das nações que respeitam o estado de direito.
É interessante assistir aos jornalistas pró-Washington e a suas fontes buscando, na decisão do Equador de oferecer asilo a Assange, razões de interesse próprio. Correa quer retratar-se como campeão da liberdade de expressão, dizem eles; também alegam que atingir os Estados Unidos, ou apresentar-se como líder internacional. É tudo ridículo.
Correa não procurou confusão e a disputa é, desde o início, um caso em que ele sofrerá perdas em qualquer hipótese. Enfrenta tensão crescente com três países que são diplomaticamente importantes para o Equador – EUA, Reino Unido e Suécia. Os EUA são o maior parceiro comercial do Equador e ameaçaram, diversas vezes, romper acordos comerciais que garantem os empregos de milhares de equatorianos. Como a maior parte da mídia internacional foi hostil a Assange desde o início, o pedido de asilo foi usado para atacar o Equador, e acusar o governo de um endurecimento contra a mídia interna. Como já escrevi, é um exagero grosseiro e uma falsificação da realidade equatoriana, que tem uma mídia não submetida a censura, majoritariamente na oposição ao governo. A maior parte dos leitores do mundo ouvirá, por muito tempo, apenas esta versão deturpada sobre o Equador.
Correa tomou sua decisão porque era a única opção ética a adotar. Qualquer um dos governos independentes e democráticos da América do Sul teria feito o mesmo. Quem dera as maiores organizações mundiais de mídia tivessem a mesma ética e compromisso com a liberdade de expressão e de imprensa.
Veremos agora se o governo do Reino Unido respeitará o direito internacional e as convenções de direitos humanos, oferecendo a Assange um trânsito seguro ao Equador.

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Mark Weisbrot é co-diretor do Centro para Pesquisas Econômicas e Políticas (CEPR), Também é co-roteirista (com Oliver Stone) do documentário Ao Sul da Fronteira.

Outras Palavras

14 de ago. de 2012

A xenofobia europeia


Não é surpresa. Organizado por demanda do principal partido do país, a União Democrática de Centro (que já havia conseguido, em 2009, proibir a construção de minaretes), um plebiscito legalizou (por 53% dos votos que ) a expulsão (ao final da pena) de todos estrangeiros condenado por crimes “graves” (tais como, homicídio, estupro, e assalto) mas também proxenetismo e trafico de drogas. Também terá de deixar o país quem simplesmente tiver “recebido abusivamente os benefícios sociais ou não pagar pensão alimentícia”.
É uma nova vitória para a extrema direita na Europa. Pode alimentar tentações semelhantes em outros partidos de ideologias semelhantes. Trará inevitavelmente certas consequências para a União Europeia, à qual a Suíça não pertence, mas com a qual Berna assinou, em 2002, um acordo sobre a livre circulação de pessoas. O que farão os governantes europeus quando a Suíça promover as expulsões, que são claramente dupla pena?
No fundo, a medida traduz sobretudo, numa crescente inquietude com os imigrantes, acusados de ser a raiz de todos os problemas. É evidente que todas as sociedades têm o direito de definir o que aceitam ou não, em seu espaço público. E não seria o caso de o país acolhedor modificar suas praticas em função dos novos habitantes. São estes que devem fazer um esforço de adaptação. Mas a partir destas evidências consensuais, os novos partidos da extrema direita constroem um discurso islamofóbico, expandindo seus círculos de influência e, pouco a pouco, fazendo passar todas as suas propostas extremistas.
Em nome de uma imperativa e abstrata “modernização”, as sociedades europeias são submetidas, há alguns anos, aos terremotos e traumas de uma grande violência. A lógica da competitividade foi elevada ao nível de imperativo categórico. A mundialização econômica, o crescimento da União Europeia, o fim da soberania nacional, a criação do euro, a quebra das fronteiras, a chegada massiva de imigrantes, o multiculturalismo e o desmantelamento do Estado de bem-estar social provocaram, entre muitos europeus, uma perda de referência e identidade. Além disso, tudo isso foi produzido em um contexto de grave crise financeira, econômica e social, provocando insuportaveis estragos sociais (25 milhões de desempregados, 85 milhões de pobres) e um aumento de todos os tipos de violência.
Diante da brutalidade e a rapidez de tantas mudanças, para muitos cidadãos as incertezas acumulam-se, a névoa cobre o horizonte, o mundo parece opaco e a história parece fugir de qualquer decisão. Muitos europeus sentem-se abandonados pelos governantes (de direita ou esquerda), que a mídia, aliás, não cessa de atacar como empresários fraudulentos, mentirosos e corruptos. Perplexos no centro desse furacão, muitos frustram-se e se agarram ao sentimento de que, como dizia Tocqueville, “o passado já não ilumina mais o futuro, o espirito caminha pelas trevas”…
Sobre tal terreno social – feito de medos, ameaças de desemprego, distúrbios e ressentimentos – reaparecem os velhos mágicos. Com base em argumentos demagógicos, projetam sobre o estrangeiro, o muçulmano, o judeu ou o negro, toda a causa da nova desordem e da sensação de insegurança. Os imigrantes são os alvos mais fáceis, por simbolizarem o transtorno social e representarem, ao olhos do europeu mais modesto, uma concorrência indesejável no mercado de trabalho.
A extrema direita sempre pretendeu tratar as crises designando um único culpado: o estrangeiro. É desolador constatar que essa atitude é hoje encorajada pelas contorções dos partidos democráticos, reduzidos a se interrogar sobre que dose de xenofobia seu discurso poderá incorporar.
Na França, a Front National (FN), de Jean-Marie Le Pen, propôs há algum tempo o culto do sangue e do solo, a restauração da nação (no sentido étnico do termo), o estabelecimento de um regime autoritário para lutar contra a insegurança, o retorno de uma protecionismo econômico não solidário, a volta das mulheres ao lar e a expulsão de três milhões de estrangeiros para liberar os postos de trabalho destinado aos franceses “de fibra”. Apesar de venenoso, esse discurso seduz, há algum tempo, “mais de um quarto dos franceses”.
E para atrair eleitores, o presidente Nicolas Sarkozy lançou, em julho, uma campanha contra os ciganos. O direito europeu impede a expulsão dos cidadãos dos países do bloco. Mesmo assim, o governo francês não hesitou em conduzir até a fronteira, nas duas primeiras semanas de outubro de 2010, 8.601 ciganos romenos: 7.447 “de maneira voluntaria”; 1.154, a força. Alega-se que os acordos da União Européia com a Romênia e a Bulgária, que sacramentaram a adesão desses dois países em 2007, prevêem uma carência de sete anos antes de autorizar a livre circulação de pessoas e que esse prazo não expirou1. É verdade, conforme o direito europeu em vigor. Porém esse mesmo prazo aplica-se, por exemplo, aos húngaros, tchecos e poloneses, que não foram expulsos maciçamente da França… Além disso, Paris alega que cada cigano aceitou sua partida de “maneira voluntaria”, por uma soma de 300 euros…Um “voluntariado” pouco crível. O desmantelamento de acampamentos ciganos não os deixa com outra possibilidade, senão aceitar a “ajuda” de retorno.
A Itália de Silvio Berlusconi procede da mesma maneira. Os acampamentos são regularmente evacuados. Em Milão, por exemplo, o numero de ciganos foi reduzido de dez mil a 1,2 mil…Outros países da União Europeia agem de forma mais discreta. Na Dinamarca, o prefeito de Copenhagen, Frank Jensen (social-democrata), queixou-se do numero de ciganos “envolvidos em assaltos”. Consequência: o governo deportou dez ciganos no começo de setembro, depois de já ter expulso vinte em julho. A Suécia, Áustria e Bélgica agem da mesma forma, mas concentram seus esforços sobretudo sobre os ciganos da Servia, de Kosovo e Macedônia – Estados não membros da União Europeia. Por seu lado, a Alemanha assinou um acordo para deportar cerca de 12 mil ciganos que haviam fugido de seu país no decorrer da guerra de Kosovo. Também a Suíça estabeleceu igualmente um “acordo de retorno” com as autoridades de Kosovo. Na Hungria e em Eslovênia, os ciganos foram recentemente vitimas de ataques mortais…
Essas práticas xenofóbicas são condenadas pelas instâncias internacionais. A Corte Europeia dos Direitos Humanos considera que, pelas suas atitudes contra os ciganos, dois membros da União Europeia (a República Tcheca e a Grécia), violaram direitos humanos. O Comitê da ONU que administra a Convenção Internacional contra todas Formas de Descriminação Racial (CERD), assinala que expulsões forçadas e descriminatórias de ciganos também ocorre na Bulgária, República Tcheca, Grécia, Lituânia e Romênia.
Tais praticas não são necessariamente impopulares. Na França, por exemplo, uma pesquisa indica que 55% dos católicos apoiam as expulsões dos ciganos. Um número cada vez maior de europeus pensa que a integração (em particular dos muçulmanos) é um fracasso, que o discurso sobre “o enriquecimento cultural pela diversidade” não prospera e que seria necessário, portanto, “parar de acolher tantos estrangeiros” (Le Monde, 27 novembro 2010).
A nova xenofobia europeia é expressa de forma tão aberta que diversos de governantes de centro-direita são hoje apoiado por partidos xenofóbicos e nacionalistas. Na Itália, Holanda, Áustria, Suécia e Dinamarca os governantes expressam ou uma coalizão com a extrema direita, ou uma aliança minoritária que sobrevive graças a seu consentimento.
Na Dinamarca, por exemplo, onde teve lugar, em 2006, a “crise das caricaturas de Maomé”, o primeiro-ministro liberal Anders Fogh Rasmussen é aliado, desde 2001, ao Partido do Povo Dinamarquês (PPD, extrema direita) dirigido por Pia Kjaersgaard que construiu sua popularidade numa campanha anti-imigratória, anti-muçulmana em particular. Na Suécia, os Democratas da Suécia (SD, extrema direita) entraram no Parlamento em setembro, ocupando vinte assentos. Seu programa é abertamente “xenofóbico e populista”. Um de seus anúncios na campanha eleitoral – que o Canal TV4 recusou-se a difundir – mostrava um velha senhora sueca andando apoiada sobre um andador. Mulheres com burcas, passavam à sua frente e chegavam antes dela no balcão, para alcançar os benefícios sociais…
Na Áustria, no período das eleições regionais e municipais de outubro, o partido FPÖ (extrema direita), dirigido por Heinz-Christian Strache, progrediu para 27% (14,83% em 2005). Na Holanda, os deputados democrata-cristãos e liberais, validaram por unanimidade, em 5 de outubro, um acordo governamental com o PVV (Partido da liberdade), islamofóbico, de Geert Wilders, que controla vinte assentos no Parlamento. Em troca de seu apoio, o PVV obteve concessões para tratar os assuntos de imigração. A lei que proíbe o uso da burca será votad nos próximos meses.
Na Itália, a nova lei de segurança, promulgada pelo primeiro-ministro Sílvio Berlusconi, permite a formação das “patrulhas cidadãs”, controladas pela extrema direita. Já são mais de duas mil. Constituem-se de voluntários, pertencentes à Liga do Norte, de Umberto Bossi, ou ao Movimento Social Italiano – Direita Nacional (MSI-DN). Os militantes usam vestimentas paramilitares: camisa cáqui, calças cinzas e bonés pretos com logo da águia imperial romana… Seu objetivo declarado é: “Salvar a integridade nacional” e “limpar” as cidades e vilarejos de “imigrantes indesejáveis”.
Muitos países europeus decidiram limitar as “práticas culturais” dos muçulmanos. França e Bélgica, por exemplo, votaram leis contra o uso do véu, burca ou niqab. Esses países proíbem agora qualquer rosto “mascarado ou dissimulado, em parte ou por inteiro, nos meios públicos”. Mesmo que as estratégias divirjam, essa questão influencia igualmente outros Estados europeus. Na Dinamarca, o uso do véu por inteiro é, desde 2010, limitado em espaços públicos. Na Holanda, há vários projetos para proibi-los, especialmente na esfera educacional e pública. Barcelona, a segunda cidade da Espanha, está preste de proibir a burca e o niqab em edifícios municipais, como já foi decidido em algumas cidades da Catalunha.
Na Alemanha, sob a pressão de seu partido, CDU (democrata-cristão), que exige uma atitude mais dura sobre a imigração, principalmente contra os muçulmanos, a chanceler Angela Merkel afirmou, em 17 de outubro, que “o conceito de sociedade multicultural alemã fracassou”. Merkel lançou uma advertência aos imigrantes: “Aquele que não aprender imediatamente o alemão, não é benvindo”. Suas declarações são reforçadas pelo presidente do lander de Hesse, Volker Bouffer, barão da CDU: “O Islã não pertence à república”. O presidente do grupo parlamentar da CDU, Volker Kauder, declarou também: “O islamismo não responde às exigências de nossa Constituição, fundada sobre nossa tradição judaico-cristã”. Mais de um terço dos alemães estimam que seu país estaria melhor sem os muçulmanos, 55% declaram ver os muçulmanos como pessoas “desagradáveis” e 58% estimam que “seja preciso proibir as praticas de sua religião”.
Em toda União Europeia, em 2010, avançaram muito as posições extremistas, inclusive “antidemocratas e racistas”, bem como a aceitação do darwinismo social. O “potencial antidemocrático” da sociedade pode ser medido agora, na Europa, pelo termômetro da islamofobia.
Segundo um estudo conduzido pela Fundação Friedrich Ebert, e publicado em 13 de outubro, a atual crise econômica “deslocou para direita o espaço politico” europeu e põem concepções extremistas no centro do discurso eleitoral. A xenofobia expressa-se agora de maneira desinibida. Tudo faz temer que – como nos EUA com o populismo do Tea Party – as ideias politicas radicalizem-se à direita. E terminem por ameaçar a democracia.
1A livre circulação de trabalhadores dá a todo cidadão da União Europeia (UE) o direito de trabalhar e viver em qualquer país do bloco. Esta liberdade fundamental, instituída pelo artigo 39º do tratado CE, permite:
  • Buscar trabalho em outro país;
  • Lá trabalhar sem precisar de uma licença de trabalho;
  • Lá viver com este objetivo;
  • Lá permanecer mesmo terminar o trabalho;
  • Beneficiar-se do mesmo tratamento dispensado aos cidadãos desse país no que concerne ao acesso ao emprego, às condições de trabalho, e a quaisquer outras vantagens sociais ou fiscais capazes de facilitar a integração no pais de acolhimento
Os cidadãos búlgaros, tchecos, estões, lituanos, húngaros, poloneses, romenos, eslovenos e eslovacos podem encontrar algumas restrições para trabalhar em outros países. No entanto, essas restrições não devem exceder um período de sete anos a partir da adesão destes países à UE (Bulgária e Romênia entraram em 1º de janeiro de 2007, todos os demais em 1º de maio de 2004)
Fonte:

Por

Por Ignacio Ramonet
Le Monde Diplomatiqu
Tradução: Cauê Seigne Ameni